Artigo de Opinião


Desesperar jamais!

O que tem mais nos angustiado nestes tempos? São tantas as situações que nos amedrontam! Diante do quadro instalado, são muitas as reclamações que nos rodeiam. Por mais que se diga que é preciso desacelerar as nossas agendas, o ritmo em nossas vidas continua o mesmo!

Quando paramos para conversar sobre o estilo de vida atual, observamos que precisamos urgentemente de mudanças profundas. A correria dos tempos atuais, o consumismo desenfreado, as relações de trabalho precarizadas, a loucura por acumular patrimônio ou adquirir bens de consumo, a degradação ambiental, o estado de fome e insegurança alimentar por que passamos, têm provocado uma dor insuportável em muita gente. Em tais condições, parece que quanto mais os dias se passam, mas o estado de vazio e de angústia se aprofundam. Afinal, aquilo que fomos levados a escolher enquanto centralidade, não nos complementa enquanto pessoas.

Podemos imaginar que esta era a situação vivenciada por Pedro, Tomé, Natanael, Tiago e João, na cena do evangelho da liturgia deste terceiro domingo da Páscoa (João 21,1-19). Quando algo não está bem, até mesmo aquilo que de mais rotineiro se faz, não dá certo! É como se diz: o que está ruim, tende a piorar ainda mais!

Eis, que quando tudo parece está no fundo do poço, aparece alguém, com interesse de abrir um diálogo com aquele grupo que já não tinha mais nada a fazer. O diálogo parte de uma situação real: “tendes algo para comer?” Como esta pergunta está atual?! Quantas famílias, assim como aquele grupo de pescadores, não estão dando a mesma resposta: “Não”.

O “lançai a rede à direita da barca, e achareis” é uma expressão que leva o grupo não a ficar silenciado perante a sua dor, mas a atender a uma voz que lhes aponta uma luz para vencer aquilo que mais lhe angustia no momento: a fome. O individualismo perante o sofrimento, mesmo estando no mesmo barco, não gera soluções. É preciso não cair no pessimismo, perante o caos instalado. A saída apontada ao grupo não sugere para uma desistência, mas para uma mudança de rumo. E mesmo naquele ambiente que parecia estéril, de repente brota a abundância. Na cena, a solução para a fome estava no próprio espaço que insistia em retribuir o vazio das redes lançadas.

Diante da abundância, pela mudança de método proposto, volta-se a realidade com um olhar diferenciado. De repente, aquela pessoa que não estava no barco, mas que da margem aponta uma mudança de rumo, oferece ao grupo um pouco do que ele trazia (peixe e pão) e, ao mesmo tempo, provoca o grupo a experiência da partilha. Na cena, o grupo reacende a esperança, ao reconhecer quem fora aquele que propôs a mudança: o ressuscitado. Agora, o grupo reanimado, mediante a presença do ressuscitado, partilha o pão e o peixe.

Da cena, aprendemos que o mar pode ser entendido como o contexto, no qual estamos inseridos. Por um lado, estéril, mas, por outro, com a possibilidade de que saídas sejam apontadas para a retomada daquilo que nos causa insegurança. Diante da fome, não serão soluções mágicas que saciará o povo, mas uma mudança de rumo na forma de gerir aquilo que é produzido no meio em que vivemos. A solução está no meio de nós! Entretanto, cada pequeno grupo tem que acreditar na existência de estratégias que possibilitem a solução para a superação da fome que nos rodeia. O nosso país é campeão na produção de alimentos, mas bate recordes na concentração dos bens que são produzidos. A lógica econômica tem que mudar. É o que nos tem provocado o Papa Francisco, ao convocar jovens para apontar saídas econômicas que garantam o bem-estar da população, sem esquecer o cuidado com a nossa Casa Comum.

O zelo proposto na cena traz o cuidado com o outro como meta a seguir. Há que se compreender que é pela força do amor, que se possibilitará a mudança no jeito de cuidar das pessoas e do ambiente. O “apascenta as minhas ovelhas” é uma provocação sobre o estado de abandono que se encontram as multidões: o povo sofre como ovelhas sem pastor e muitas vezes quem se propõe como administrador, age como lobos, disfarçados em peles de cordeiro.

O caos ora instalado não deve ser motivo para desespero. Precisamos fortalecer as nossas bases a fim de que encontremos saídas. Mesmo diante tanta violência e dor, não podemos nos desesperar, mas buscar saídas que nos unifiquem sempre mais.

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